Teresa Cristina Pisani Domiciano
Luiz Fernando Miguel Lopes
- INTRODUÇÃO
Vivemos tempos inéditos: as pessoas estão cada vez mais focadas no individual, naquilo que mais lhes fala ao “ego”. O mundo já não é o mesmo de ontem, somos tentados a todo instante a viver relações passageiras, bombardeados por todos os lados pelas mídias digitais; somos quase que obrigados a viver tudo agora; não nos desconectamos em momento algum do exterior. Os sentimentos reais e virtuais se chocam em um emaranhado onde o “online e o offline” já não se separam mais. Sobre cada pessoa deste novo tempo pesa uma sobrecarga de energias, resultando em perda das prioridades, gerando ansiedade e angustia; o que produz a sensação de estar correndo atrás do tempo para responder a tudo e nunca ter terminado nada. E o tributo que se paga por isso é estar sempre insatisfeito.
Assim, não se pode refletir sobre presentismo e imediatismo sem considerar as questões referentes à globalização, à modernidade líquida e à hipermodernidade.
Acrescentamos apenas algumas palavras sobre estes conceitos para alinhar a nossa reflexão.
Provavelmente a era em que vivemos é a que mais experimenta a questão da globalização com seus impactos positivos e negativos.
A Globalização, segundo o sociólogo Bauman (1999, p. 7), ao iniciar seu livro que leva este nome, é um processo que
está na ordem do dia; uma palavra da moda que se transforma rapidamente em um lema, uma encantação mágica, uma senha capaz de abrir as portas de todos os mistérios presentes e futuros. Para alguns, globalização é o que devemos fazer se quisermos ser felizes; para outros, é a causa da nossa infelicidade. Para todos, porém, ‘globalização’ é o destino irremediável do mundo, um processo irreversível; é também um processo que nos afeta a todos na mesma medida e da mesma maneira. Estamos todos sendo ‘globalizados’ – e isso significa basicamente o mesmo para todos.
No cenário globalizado, a comunicação é instantânea, as distâncias são encurtadas, os contatos físicos entre os indivíduos cada vez mais distantes, pois não precisamos mais do corpóreo já que a internet nos coloca em comunicação. O sentido de comunidade é destruído, sem falar ainda da grande distância que se cria entre os ricos e os pobres, pois a diminuição das condições de vida, o mercado engrandecido e o consumo exacerbado tornam “o rico cada vez mais rico e o pobre cada vez mais pobre”.
[1] Estes são alguns fatores sociológicos que caracterizam a globalização.
Com a globalização chegamos ao que se costuma definir como pós-modernidade, Modernidade Líquida, hipermodernidade. Fenômenos trazidos pela globalização e que transformam o cenário do mundo. Por Modernidade Líquida, Bauman, se refere à fluidez das relações. Modernidade líquida é ver o tempo, a vida, as relações, a própria identidade escorrerem sem que possamos detê-las. De forma popular é o que diz a letra da música de Lulu Santos, Tempos Modernos: “Hoje o tempo voa, amor escorre pelas mãos. Mesmo sem se sentir e Não há tempo que volte, amor. Vamos viver tudo que há pra viver. Vamos nos permitir.”
Outro conceito a ser trazido para a nossa reflexão é o da hipermodernidade. Temos a consciência clara de que estamos cada vez mais conectados com as máquinas e simultaneamente desplugados das relações afetivas. Não que as tecnologias sejam o ópio da sociedade “hipermoderna”, mas sim, que elas têm o poder de nos afastar da afetividade do toque, do contato físico.
A Hipermodernidade, segundo Gilles Lipovetsky, é marcada pela descaracterização do sujeito integral; uma sociedade na qual se vive uma “escalada aos extremos”, baseada sempre na vontade do individuo e no consumismo. O filósofo trata ainda a “moda” como um produto da sociedade de consumo, o que retrata em grande parte a cultura vivenciada por nossa juventude, na qual o capital e a aparência se sobrepõem sobre as relações sociais propriamente ditas.
Podemos afirmar, brincando com as palavras e com o ditado popular, que em tempos de hipermodernidade, quem vai com calma e nada contra a corrente é louco.
Nossa pretensão neste trabalho é a de auxiliar e iluminar possibilidades, de trabalhar processos pensados e avaliados em meio a tanta agitação e superficialidade coletiva, refletindo algumas situações vivenciadas pela juventude.
- PRESENTISMO E IMEDIATISMO E SEUS DESDOBRAMENTOS
Como vimos, em um contexto marcado pela ditadura do tempo presente, expressões como “faça já!”, “viva agora!”, “o futuro é agora!”, “você tem somente o hoje para ser feliz!” e outras, formam, aos poucos, o inconsciente coletivo. Se o amanhã não nos pertence e se o passado ficou para trás, então que outra preocupação teríamos nós a não ser fruir ao máximo o momento em que vivemos? Nesse axioma está pautada a lógica “imediatista”: ou você aproveita completamente o momento, ou estará fadado a enfrentar a decepção de ser alguém que “não soube viver”.
A velocidade, o excesso de informações, de conteúdos midiáticos e de produtos de consumo cercam nossa sociedade de todos os lados, quase que nos sufocando, tanto que Lipovetsky (2004, p. 55) afirma que
já faz tempo que a sociedade de consumo se exibe sob o signo do excesso, da profusão de mercadorias; pois agora isso se exacerbou com os hipermercados e shopping centers, cada vez mais gigantescos, que oferecem uma pletora de produtos, marcas e serviços. Cada domínio apresenta uma vertente excrescente, desmesurada, ‘sem limites’.
O que se vê, portanto é uma sociedade que passa a se acostumar com o exagero do possuir e nega a profundidade e a importância das relações. “Ter coisas” é mais importante que “ser alguém”. Por isso mesmo o “Hipermercado” é o “lugar” da “Hipermodernidade”, é onde se encontra tudo aquilo de que se precisa para viver bem. Nisto se enquadra outra vertente do pensamento hipermoderno, ou seja, todos devem viver bem, sem sofrimento, longe das frustrações. Os próprios cartões de crédito seguem esta lógica: “por que a vida é agora”. [2]
Há quem diga que o “presentismo” e o “imediatismo” sejam os “cânceres” do nosso século. Pessoas e situações desagradáveis são invisíveis para nós, não nos tocam. Vivemos de aparência, ansiosos e deprimidos em relação ao futuro.
2.1 A MODERNIDADE LÍQUIDA E SUAS CONSEQUÊNCIAS
Em sua obra e conceituação, Bauman esforça-se por mostrar a dificuldade humana de comunicar com afeto, uma vez que em tempos de conexão a comunicação faz-se essencial para o existir humano. Todavia, o que vemos em nossos dias pode ser definido como um excesso de informação de todo tipo, em detrimento de uma comunicação verdadeiramente amorosa e afetiva, especialmente entre a juventude. Para esta questão o sociólogo polonês usa o exemplo do “vaso de cristal”: basta cair para se desfazer em mil pedaços. Os “laços afetivos” se desfazem com a mesma intensidade com que se iniciam: com um botão somos capazes de “deletar” alguém de nossas vidas. E o botão “delete” passa a coexistir com o cotidiano, facilitando a forma como vemos o mundo, pois há qualquer instante podemos tirar e colocar quem quisermos de nossa história.
Esse fato aparece quando fazemos uma análise profunda da forma como as pessoas se relacionam, em muitos casos troca-se a preferência pelo olho a olho, por uma relação digital, puramente pautada na economia de palavras ou na não vontade de aproximação do outro. O diferente é estranho. O outro é diferente. Portanto, o outro é estranho. Não obstante, a relação parece ser outra quando se trata do mundo digital e das relações hipermodernas. Troca-se o conhecido pelo desconhecido. O digital é atraente porque evita o choque de olhares, não nos coloca cara a cara com o outro e nos proporciona, em larga escala, sermos aquilo que quisermos, pelo menos aparentemente, podendo assim, possuir várias identidades.
E uma vez acenada a questão da “aparência”, podemos afirmar que no mundo digital, sempre em movimento e em constante mutação, a essência não importa tanto, o que é importante é mostrar algo belo, atraente; uma vez que a formatação do conceito de beleza é feita a partir dos julgamentos dos próprios indivíduos. Nisto reside a importância dos “emoticons” das redes sociais: quem nunca mandou um “emoticon” sorridente sem mover um músculo da face, que atire a primeira pedra.
Em nossos tempos sabemos muito sobre todas as coisas, ao passo que sabemos tão pouco sobre o humano. Temos resposta e encontramos quase tudo no Google, mas não sabemos encontrar muitas vezes o caminho para o outro. Nesse ponto faz-se necessário pensar em como estamos lidando com a noção de comunidade, de sociedade, pois se não estamos atentos ao outro, perdemos o que de mais valioso tem a nossa humanidade, isto é, sermos humanos e solidários. Que finalidade teria a tecnologia senão a de nos aproximar dos outros?
2.2 A FUNÇÃO “STORIES” NAS MÍDIAS SOCIAIS: DURE APENAS 24 HORAS!
Durante os últimos meses temos acompanhado nas mídias sociais uma atualização que aparentemente é simples, mas que nos apresenta a possibilidade de uma análise mais séria sobre o assunto: trata-se da função “Stories”, que nos dá a possibilidade de postar nas mídias sociais, entre elas Facebook, Instagram, Snapchat, um conteúdo que dure apenas 24 horas e, após isso, seja “autodestruído”.
Essa nova “onda” – trazida pela ferramenta supracitada – abre espaço para pensarmos a cultura e conceito de tempo desenvolvido hoje, especialmente entre a juventude, a “efemeridade de conteúdo” que se compartilha e a invasão de exposição da própria privacidade. Um conteúdo que foi produzido há mais de um ano, na boca dos jovens é considerado “velho” ou “antigo”. E entra no discurso do próprio grupo ao qual o jovem pertence que tal coisa é “ultrapassada”, basta olharmos o exemplo de músicas, filmes e acontecimentos que, estando não muito distantes de nós, são tratados como “do passado”.
Isso tudo está muito relacionado à forma como os novos agentes da tecnologia, ou a chamada “geração y” se relaciona nos espaços digitais: o que convém é o agora, as sensações que estamos experimentando e os fatos que estamos vivenciando. A função Stories proporciona justamente isso: compartilhe o momento! O conceito de “história”, tradução literal do nome da ferramenta, é reduzido ao momento presente, ou simplesmente às últimas 24 horas. Em alguns casos, como no aplicativo Snapchat, há a opção de que a “história” dure menos ainda, até mesmo segundos, se for da vontade do usuário. A banalização da história acontece quando o conceito utilizado no aplicativo é transposto para a vida real.
O smartphone é dotado da capacidade de nos dar a sensação de que temos o “mundo” na palma das mãos, poderia até ser mesmo para aqueles que utilizam os aparelhos para seu trabalho, porém, o instrumento não pode ser fim em si mesmo, e nesse aspecto reside o fato de a todo instante estarmos sofrendo uma opressão silenciosa, ou seja, temos tanta tecnologia, dominamos tantas técnicas e perdemos o essencial de nossa condição humana, que é a capacidade de relacionamento afetivo.
3) CRIAÇÃO DE PROCESSOS EM TEMPOS LÍQUIDOS: PROVOCAÇÕES
A juventude é amplamente afetada por essa “novidade,” imposta pelos novos tempos. Ninguém mais tem paciência e por vezes, falta a compreensão correta da importância de esperar e caminhar com calma. A esse respeito, a elaboração de processos nem sempre encontra boa acolhida, pois educar por meio de processos é como ir fazendo uma receita saborosa, mas pela amplitude do fato, a realização é demorada e exigente. Para que o bolo resulte gostoso e nutritivo, é necessário acrescentar cada ingrediente – um a um – com esperança, sabendo valorizar cada parte do processo.
Em tempos de imediatismo, somos interpelados a não esperar que os processos se desenvolvam no ritmo que eles exigem, pela ânsia de querer ver logo o fim, ou seja, não ter a paciência de esperar que cada passo se desenrole a seu tempo. A pressa e a ansiedade são prejudiciais ao processo. Pressa e ansiedade se complementam. Ambas, são filhas prediletas dos novos tempos imediatistas.
Na lógica do processo, apresentamos alguns elementos a serem levados em conta, em tempos de imediatismo. Por isso, sugerem-se alguns “resgates”:
- Resgate da Identidade e do acompanhamento
Sabemos que nem sempre, ao se olhar, o jovem aceita o que vê. A imagem refletida, às vezes, é negada, ignorada ou até guardada em algum lugar desconhecido dentro dele, ressurgindo ou não, tempos depois. Ao mesmo tempo constatamos que há dificuldades entre pais e educadores para ajudar o jovem a descobrir sua identidade pessoal. Daí as buscas por reconhecimento fora dos âmbitos familiar e escolar.
Ao querer afirmar sua autonomia em relação à família, ele inicia seu percurso pessoal de construção de novas relações e expressões de liberdade. Busca “divertimento”, denotando a urgência de estar bem consigo mesmo, de ser reconhecido, amado. Além de promover verdadeira confusão entre o que é íntimo e o que é externo, expondo-se continuamente a exibir sem pudor, sentimentos profundos, segredos de sua própria intimidade e até a dos outros.
Imersos em uma constante sensação de provisoriedade e isentos dos processos de feitura em que o desejo de ter atravessa o fazer e a espera, os jovens terão que vivenciar experiências que envolvem resolução de dúvidas, conflitos e o encontro de soluções. E para muitos deles os limites são muito amplos e estar no mundo pode tornar-se assustador. Por isso a presença do “adulto significativo” é tão necessária para auxiliar, por meio das trocas e afetos, a melhor compreensão dos limites, bem como a definição dos seus espaços internos e externos. Da mesma forma, o adulto precisa entender e aceitar seus limites, para que também o jovem aceite os próprios.
Assim, buscando esclarecer sua identidade e sua função, o educador vai interpretando as demandas e ressaltando as prioridades, de tal forma que o vínculo entre eles se estabeleça, em compromisso de reciprocidade e empatia, com vistas ao desenvolvimento pessoal e social.
2. Resgate da reflexão
O processo leva à reflexão sobre a fé. Quando se fala em Processo de Educação à Fé, estamos admitindo a necessidade de reflexões sobre teoria e prática da fé. Estas reflexões passam por toda a vivência do jovem. No imediatismo somos desafiados a cortar o processo, usando atalhos, ou seja: dar respostas e soluções rápidas, buscando alcançar resultados imediatos. Daí a necessidade urgente de criar espaços de reflexão, que ajudem o jovem a encontrar o sentido dessas vivências, iluminadas pela fé.
Conforme Libânio, a cultura midiática mina três importantes campos da fé: o conteúdo do saber, os símbolos e a prática da fé. O saber perde importância, pois temos conhecimento rápido e fácil via internet, dificultando o aprofundamento, a reflexão. São, portanto, caminhos opostos: a fé aprofunda o conhecimento, ao contrário a cultura midiática navega pelos mares da simples informação. A fé alimenta-se de símbolos e ritos, a cultura midiática joga com os ícones que substituem os ideais por sinais informativos, sem nenhuma perspectiva de pensamento. Se queremos trabalhar por meio de processos, necessitamos resgatar a reflexão como construção do conhecimento e o conhecimento como base da fé.
3. Resgate da história
A criação de processos passa pela necessidade de fazermos um resgate da história, não puramente historicista, pois o historicismo enxerga a história com um fim em si mesma; muito menos futurista, que é o historicismo, que vive em função somente do amanhã.
Falar de processos ou de educar por meio de processos é um desafio principalmente no que tange as questões de fé. Nossa fé cristã tem raízes históricas. Em um contexto onde a história perdeu o seu valor, onde a temporalização deixou de ser linear, ou seja, a consideração das três dimensões de passado, presente e futuro, ganhou espaço o presentismo – a vida em 24 horas. Faz-se, portanto necessário, recuperar o verdadeiro sentido do tempo e da história. Tempo como Cronos e Kairós, pois a fé cristã, “recebe do passado bíblico os dados fundamentais e anuncia o futuro… O presente para ela só se entende na dupla relação com a Tradição com a Escatologia”. (Libânio, 2014, pp. 114-115).
Uma possibilidade, neste caso é o resgate da narração e da hipernarração, devolvendo a história ao seu devido lugar. É constatar a ação salvadora de um Deus, presente na história. Portanto, projetar um itinerário de Educação à Fé, na linha da narração, relendo as experiências de vida à luz da fé. Isso é de vital importância para o trabalho com os jovens. O método narrativo tem algo de evocação, pois traz para o presente o que já foi feito, estudado ou aprendido no passado e ajuda a sonhar o futuro. Faz enxergar que a vida não é só o momento “agora”. É útil, pois, abordar questões como a dor, a morte, o silêncio, os medos, a liberdade; estas ou outras questões existenciais, no formato de narração. Com este procedimento o emitente narra a sua história e o receptor escuta e se confronta consigo mesmo. Na reflexão pessoal ou ao interno dos grupos, surge naturalmente o convite a assumir a própria história. Quem narra, não narra um evento casual, narra a vida. Sendo assim, a narração procura dar respostas às grandes interrogações: Quem eu sou? De onde vim? Para onde vou?
4. O resgate da comunidade
A “Cultura do encontro” de que tanto fala o Papa Francisco, é mais que urgente para o nosso tempo. É possível desacelerar para encontrar as pessoas? Encontrar o outro? Encontrar Deus? “Keep Calm!”. O ritmo acelerado da vida nas grandes cidades, nos torna alheios àqueles que vivem à nossa volta. Neste sentido, vemos, mas não vemos. Não vemos o outro, não vemos as situações, não nos damos conta da presença do Outro e do outro. Somos distraídos, ou nos habituamos a olhar e nem percebemos o mal que está ao nosso redor. O sofrimento, a pobreza, o jovem caído na rua, a criança maltrapilha. Parece que nada nos move. Entramos em uma certa inércia e pouco a pouco vamos nos alheiando ou perdendo a sensibilidade diante de toda a dura realidade. A impressão que se tem é que a esperança não nos move. O que se dizia de Dom Bosco, parafraseando as palavras da Carta aos Hebreus (11,27) “caminhava como se visse o invisível,” hoje se pode traduzir na necessidade que temos de caminhar enxergando além das aparências, olhando a realidade com a fé que transfigura as duras realidades e as transforma em ocasião de fazer o bem. Se as relações são frias na selva de pedra é preciso aquecê-las. Um “bom-dia” ou “boa-noite” ditos com presença e alegria, podem alimentar ou criar uma relação de amizade. A canção do paulistano retrata a velocidade da cidade que não para e massifica. Assim canta Billy Blanco na música “Amanhecendo”:
A cidade não desperta apenas acerta a sua posição. Porque tudo se repete são sete, e às sete explode em multidão. Portas de aço levantam! Todos parecem correr! Não correm de, correm para Para São Paulo crescer!: Vam bora, vam bora Olha a hora Vam bora, vam bora.
É preciso vencer a indiferença e construir a cultura do encontro, assim nos pede Papa Francisco. Educar à fé é resgatar o sentido do convívio, do grupo, das experiências comunitárias, da dimensão comunitária da fé. Resgatar o sentido de pertença e da corresponsabilidade. Não somos uma ilha perdida em um oceano. Precisamos uns dos outros. Construímos com o outro. Jesus foi ao encontro das pessoas (Samaritana, Zaqueu, Bartimeu, Lázaro, Marta, Maria e tantos outros). Também para o jovem, a proposta de ir ao encontro, de “sair do sofá”[3], de desacomodar é atual. A Carta Encíclica Evangelii Gaudium, do Papa Francisco (2013, n. 88) ilumina nossa reflexão
O Evangelho convida-nos sempre a abraçar o risco do encontro com o rosto do outro, com a sua presença física que interpela, com o seu sofrimento e suas reivindicações, com a sua alegria contagiosa permanecendo lado a lado. A verdadeira fé no Filho de Deus feito carne é inseparável do dom de si mesmo, da pertença à comunidade, do serviço, da reconciliação com a carne dos outros. Na sua encarnação, o Filho de Deus convidou-nos à revolução da ternura.
Este é o convite e a proposta. Desacelerar para ser pontes de comunhão, fortalecendo vínculos de fraternidade. Portanto, no processo é sempre importante recordar a dimensão comunitária da fé.
Ainda conforme a Evangelii Gaudium (Papa Francisco 2013, n. 87):
Neste tempo em que as redes e demais instrumentos da comunicação humana alcançaram progressos inauditos, sentimos o desafio de descobrir e transmitir a «mística» de viver juntos, misturar-nos, encontrar-nos, dar o braço, apoiar-nos, participar nesta maré um pouco caótica que pode transformar-se numa verdadeira experiência de fraternidade, numa caravana solidária, numa peregrinação sagrada. Assim, as maiores possibilidades de comunicação traduzir-se-ão em novas oportunidades de encontro e solidariedade entre todos. Como seria bom, salutar, libertador, esperançoso, se pudéssemos trilhar este caminho! Sair de si mesmo para se unir aos outros faz bem. Fechar-se em si mesmo é provar o veneno amargo da imanência, e a humanidade perderá com cada opção egoísta que fizermos.
Percebemos que hoje, há famílias que não têm amigos nem exercitam a alteridade. E isto soa como um sinal de que a união familiar também é precária. Daí a necessidade desse resgate através, inclusive, de uma espiritualidade saudável que nos torne capazes de nos relacionarmos e nos tornarmos receptivos, exercitando a verdadeira e salutar convivência.
5. O resgate da experiência
Parece existir uma correlação entre o tempo do instantâneo e as sensações de esvaziamento e de falta de sentido vivenciadas por muitos jovens e até por crianças deprimidas ou apresentado outros sintomas porque não participam ativamente de suas próprias vidas, geridas sempre por algo externo, do fator publicitário à família e à sociedade.
Sabemos que não é possível combater o tempo, mas precisamos permitir, aos jovens e crianças, possibilidades de testar, experimentar e errar, suportando o tempo de espera e o ritmo de cada um. Afinal, os processos, constituídos de ciclos, ordem e limites, jamais devem ser abolidos da vida, sob pena de tornar muito difícil suportar o que não vem pronto, gerando muito sofrimento.
Portanto, valorizar a experiência, propor momentos de pausa e de lazer “perdendo tempo” para possibilitar a criação de novas ideias, abrir horizontes de sonho. “Foi o tempo que perdeste com a tua rosa que fez tua rosa tão importante” ou “os homens compram tudo pronto nas lojas, mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos”. Pensamos que estas célebres frases de Saint-Exupéry, no livro “O Pequeno Príncipe”, contrastem bem com as propostas do imediatismo e presentismo neste contexto da nossa reflexão.
- Resgate do Projeto de vida
Frutos de 350 milhões de possibilidades, fomos projetados por outros, ou seja, por nossos pais. Portanto, somos chamados à realização de nós mesmos, interna e externamente. Seres únicos, vamo-nos descobrindo aos poucos. E o que fazer com o que somos? O que desejamos? Só chegaremos a algum lugar, se soubermos quem somos.
Condicionados por tantos meios, temos que priorizar o autoconhecimento, pois a polifonia que há em nós precisa ser harmonizada ou a multiplicidade de energias que existem em nós precisam ser organizadas em vista da construção de nosso ser inteiro.
Perguntar “Como eu me percebo? Como me descrevo?” é condição sine qua non para a integração do projeto de vida. Completada pelo questionamento: “O que desejo?”, ajudando a encontrar um significado para a vida.
Para tanto, algumas prerrogativas são necessárias: estabelecer parcerias (alguém que me ajude a olhar meu próprio mundo e o mundo à minha volta), admitir erros, distinguir o que é importante do que é urgente, planejar a curto, médio e longo prazos, considerando as perspectivas da gradualidade e da flexibilidade, além de dar prioridade ao que pensamos para nós e não ao que pensaram para nós.
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo teve a finalidade de explicitar os conceitos de “Presentismo” e “Imediatismo”, bem como seus possíveis estudos e aprofundamentos indicando a probabilidade e utilidade de trabalharmos com processos. O tema apresentado propôs-se traçar um caminho teórico e prático sobre esses conceitos e sua relação educativa com a juventude de nossos tempos. Em meio ao desafio de construirmos relações sólidas e duradouras é preciso que se tenha a coragem de pensar e ousar fazer a diferença, aceitando e compreendendo a história, recriando o que se vive no presente e projetando com esperança e fé o futuro.
- REFERÊNCIAS
BAUMAN, Zygmunt. Globalização: As consequências humanas. Rio de Janeiro: Zahar Editores. 1999.
________________. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar Editores. 2001.
FERNANDES, Sílvia Regina Alves. Mosaicos contemporâneos: cultura religiosa e mediática entre os jovens. In BOEING, Antônio (Org.). Trilhas do Saber: Pastoral – Excelência Acadêmica e Evangelizadora. Disponível em <http://edbbrasil.org.br/gratuitos/trilhas-do-saber-1.pdf> Acesso em 17 de maio de 2017.
FRANCISCO, Papa. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. Disponível em <https://w2.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_evangelii-gaudium.html> acesso em 28 de maio de 2017.
LIBÂNIO, João Batista. Introdução à Teologia Fundamental. São Paulo: Editora Paulus, 2014.
LIPOVETSKY, Gilles. Os tempos hipermodernos. Trad. Mario Vilela. São Paulo: Editora Barcarolla, 2004.
PERONDI, Maurício. Pastoral e Juventude: Desafios dos novos pátios existenciais. In BOEING, Antônio (Org.). Coleção Trilhas do Saber: Pastoral – Excelência Acadêmica e Evangelizadora. Volume 01. Disponível em <http://edbbrasil.org.br/gratuitos/trilhas-do-saber-1.pdf> Acesso em 17 de maio de 2017.
SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O pequeno príncipe. Rio de Janeiro, Editora Agir, 2009. Aquarelas do autor. 48ª edição / 49ª reimpressão. Tradução por Dom Marcos Barbosa. 93 páginas.
[1] Isso é exposto na canção “xibom bombom”, em uma canção-sátira de protesto do grupo “as meninas”, que expõe o trágico do cotidiano vivenciado pelas pessoas, nas “lutas de classes” travadas desde os últimos tempos.
[2] Slogan publicitário utilizado pela operadora de cartões de crédito VISA, fazendo alusão à compra necessária no momento.
[3] Referência ao discurso do Papa Francisco, na Vigília de Oração dos jovens, dia 30 de julho de 2016. Jornada Mundial da Juventude, Cracóvia – Polônia.